«A vigilância tecnológica e política aperfeiçoou a sua granularidade e impessoalidade automática por meio de programas de software que permitem o rastreamento individual por coordenadas de GPS e prospeção massiva de dados nas redes de telecomunicação. A aplicação XKeyscore da Agência de Segurança Nacional dos Estados Unidos é apenas um exemplo do grau em que os nossos direitos à privacidade podem ser e foram violados no ambiente medial atual. Um número crescente das nossas ações diárias, públicas e privadas, deixa vestígios em sistemas de dados, e esses vestígios são usados para monitorizar o comportamento atual e condicionar o comportamento futuro, garantindo conformidade com a administração digital das nossas existências, desejos e imaginações.
Os grandes sistemas de dados prometem bondade e respeito nessa coleção massiva de dados, oferecendo condições de serviço que nos colocam em posições marcadamente assimétricas, alimentando-os constantemente com informações que nos serão vendidas, apenas alguns instantes depois, sob a forma de produtos e serviços, à medida que ensinamos o sistema de dados a programar melhor os nossos perfis de cidadãos-consumidores. A virtualização tanto da economia como da identidade individual conferiu à rede eletrónica a capacidade de modelar e reconstruir uma grande quantidade de interações e situações sociais como puros fluxos de dados. Os sistemas de software podem ser descritos também como formas de autodisciplina e autocontrolo que transcodificam as nossas relações sociais de acordo com os seus modelos de dados e algoritmos. Usando uma perspetiva de estudos de software, chamarei a atenção para o papel dos sistemas de redes globais na reconfiguração das vozes privadas e dos espaços públicos na sociedade digital».
Manuel Portela é Professor Auxiliar com Agregação no Departamento de Línguas, Literaturas e Culturas da Universidade de Coimbra. É Doutorado em Cultura Inglesa pela Universidade de Coimbra (2001) e Agregado em Literatura Inglesa (2010). Foi bolseiro de pós-doutoramento da FCT no Institute for Advanced Technology in the Humanities (IATH), da Universidade da Virgínia (2008). Tem lecionado nos cursos de licenciatura de Línguas Modernas, de Estudos Artísticos e de Ciência da Informação Arquivística e Biblioteconómica; no curso de mestrado de Estudos Ingleses e Americanos, e no curso de doutoramento em Materialidades da Literatura.
Foi Diretor do Teatro Académico de Gil Vicente, em Coimbra, entre 2005 e 2008.
É investigador do Centro de Literatura Portuguesa da Universidade de Coimbra, desde 2007. Colaborou como investigador no projeto ‘PO-EX ’70-’80: Arquivo Digital da Literatura Experimental Portuguesa’ (2010-2013, Universidade Fernando Pessoa) e é o investigador responsável pelo projeto ‘Nenhum Problema Tem Solução: Um Arquivo Digital do Livro do Desassossego’ (2012-2015, CLP, Universidade de Coimbra). É autor dos livros “Scripting Reading Motions: The Codex and the Computer as Self-Reflexive Machines” (MIT Press, 2013) e “O Comércio da Literatura: Mercado e Representação” (Antígona, 2003).
Traduziu diversos autores de língua inglesa, entre os quais, Laurence Sterne, William Blake e Samuel Beckett. Recebeu em 1998 o Grande Prémio de Tradução pela obra “A Vida e Opiniões de Tristram Shandy” (2 vols., 1997-98; 2ª edição, 2014). Na última década e meia tem investigado a digitalização da literatura, tendo criado diversos programas no domínio das humanidades digitais. É diretor de um novo curso de doutoramento na Universidade de Coimbra: Estudos Avançados em Materialidades da Literatura (Programa de Doutoramento FCT).
Esta iniciativa tem entrada livre.
Por: CM Loulé