Alexandra Fernandes, gastrenterologista na ULS da Região da Leiria, presidente do Clube Português do Pâncreas (CPP)

Neste Dia Mundial do Cancro do Pâncreas, é crucial alertar para uma das doenças oncológicas mais letais e silenciosas da atualidade.

O cancro do pâncreas surge quando as células desta glândula abdominal crescem de forma descontrolada. A sua forma mais comum, o adenocarcinoma ductal pancreático, é conhecida pela sua agressividade e representa mais de 90% dos casos.

 

Números que Exigem Ação Urgente

As estatísticas são alarmantes. Ao contrário de outros tumores, a sua incidência e mortalidade têm vindo a aumentar, sendo já a quarta causa de morte por cancro. Em Portugal, em 2021, foram diagnosticados 1378 novos casos, com um número de mortes praticamente sobreponível. As projeções indicam que, até 2035, se tornará a segunda principal causa de morte por cancro no nosso país e no resto do mundo, traduzindo um aumento de 51%.

A elevada mortalidade está ligada ao diagnóstico tardio: cerca de 80% dos doentes são diagnosticados em fases avançadas, quando a cirurgia — o único tratamento com intenção curativa — já não é viável. Consequentemente, a taxa de sobrevivência global a 5 anos é cerca de 13%, mas varia significativamente com o estadio da doença no momento do diagnóstico; pode chegar a 44% na doença localizada, mas cai drasticamente para 3% na doença metastizada.

 

Fatores de Risco e Sinais de Alerta

Embora a idade e a genética sejam fatores de risco que não podemos alterar, muitos outros estão ligados ao estilo de vida e podem ser modificados por cada um de nós:

  • Tabagismo: É o principal fator, duplicando a probabilidade de desenvolver a doença.
  • Obesidade e Excesso de Peso: Aumentam o risco em cerca de 20%.
  • Diabetes: Duplica o risco deste tumor, especialmente se surgir de forma súbita após os 50 anos, e pode ser um sinal precoce da doença.
  • Dieta rica em açúcares refinados, gorduras, carnes vermelhas e produtos processados.
  • Pancreatite crónica: muitas vezes associada ao consumo excessivo de álcool e tabaco.

A história familiar de vários casos de cancro do pâncreas e certas doenças genéticas podem constituir um grupo de alto risco com indicação para rastreio em centros de referência, com o objetivo de diagnosticar a doença mais precocemente.

Infelizmente, os sintomas são muitas vezes tardios e vagos, incluindo dor abdominal que pode irradiar para as costas, perda de peso inexplicável, alterações digestivas – indigestão, vómitos e diarreia, aparecimento súbito ou descompensação de diabetes e icterícia (pele e olhos amarelados).

 

Diagnóstico, Tratamento e Esperança

O diagnóstico é feito por exames de imagem, como a Tomografia Computorizada (TC) ou a Ressonância Magnética (RM), e confirmado por biópsia. O tratamento é multidisciplinar e depende da fase da doença. A cirurgia curativa é possível em apenas 15-20% dos casos, quando a doença está confinada ao pâncreas. Para a maioria, a quimioterapia é o tratamento principal, complementada com radioterapia em alguns casos, visando controlar a doença e melhorar a qualidade de vida dos doentes.

A esperança reside na prevenção, através do controlo dos fatores de risco, e nos contínuos avanços da investigação, com o desenvolvimento de regimes de quimioterapia mais eficazes e técnicas cirúrgicas cada vez mais seguras.

Conhecer o inimigo é o primeiro passo para o vencer. O tempo para agir é agora.

 

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