Pizza da Serra | Emigrante retorna à Serra Algarvia com projeto inovador

16:56 - 13/02/2015 ATUALIDADE
Sérgio Coelho, 36 anos, é natural de Alte, mas aos 8 anos foi com os pais para França, quando estes emigraram. Aos 19 anos, voltou para Portugal, para arriscar num projeto que o pudesse devolver às raízes.

Não tendo alcançado os resultados esperados, aos 26 anos volta para a França com o objetivo de aprender padaria francesa, profissão que lhe proporcionaria um futuro. O trabalho e a experiência deram-lhe novo alento para voltar a arriscar e em maio de 2013 voltou para Portugal numa roulotte, com o objetivo de se lançar na venda ambulante de pizzas. Assim nasceu o Pizza da Serra, projeto que continua a desenvolver, com o apoio da sua namorada, Daniela Gomes, nos pequenos recantos do Algarve, onde trabalha diariamente para garantir um futuro no seu País. 

 

A Voz do Algarve – Havendo dentro do ramo da venda ambulante tanta variedade, o que o levou a optar pela Pizza?

Sérgio Coelho – Escolhi a Pizza porque é algo de que gosto e, especialmente, porque é um produto bom e saudável. Pode haver quem ache que a Pizza não é saudável, mas eu não concordo. Pode haver realmente, mas tudo tem a ver com o que colocamos na Pizza. E nós apostamos tudo na qualidade. Na França, felizmente, tive acesso a várias pizzas de qualidade, e foi isso que me deu vontade de fazer algo parecido. E numa Pizza consegue-se qualidade, o que já não se consegue, por exemplo, num Cachorro Quente, porque vai sempre ter de ter aquela salsicha que não vale nada… A não ser que se consiga uma salsicharia local que lhe consiga fazer umas salsichas de qualidade, mas não sei se seria viável.

 

V.A. – Como e onde aprendeu a fazer as Pizzas?

S.C. – Eu trabalhei durante dez anos enquanto padeiro na França. Tenho curso de padeiro e como tinha direito a formação, optei por fazer um curso de preparação de pizzas, já com a ideia de me instalar por conta própria, cá (Portugal) ou lá (França).

 

V.A. – Sendo a sua aposta num produto de qualidade, o que requer produtos de qualidade, como é que a mesma se reflete nos preços?

S.C. – Eu estou a fazer o preço mais baixo que consigo, tendo em conta o produto de qualidade que utilizo, como disse. Se trabalhasse à beira-mar, de certeza que iria vender ao mesmo preço ou mais caro, mas com metade das despesas. Aliás, os meus fornecedores têm produtos muito mais baratos do que aquilo que eu compro, mas a minha escolha é sempre a qualidade máxima, o melhor que puder fazer. Claro que isso dá menos lucro, mas fideliza clientes, que é o que interessa. Além disso, gosto de trabalhar tanto quanto possível com produtos da zona, como o chouriço e o queijo de cabra que uso. O resto dos produtos, não trabalho com os de cá, porque não há. Mas opto sempre por comprar no comércio tradicional, especialmente os frescos.   

 

V.A. – Quais as suas expetativas ao vir para Portugal? Tem valido a pena?

S.C. – Eu não vim com muitas expetativas, vim mesmo com a intenção de arriscar e, eventualmente, voltar para trás com a roulotte. Estamos em Portugal há um ano e meio e ainda não tenho a certeza se é viável. Acho que ainda é cedo, e eu não sou de desistir. Mas sou sincero, até agora tem sido complicado. Se não fosse o meu pai a ajudar-me não sei. Vai pagando as contas, mas às vezes com dificuldade. Há meses em que me apetece largar tudo e abalar, e há outros meses que correm um bocadinho melhor e a coisa compõe-se. Depende muito da altura dos festivais, que são um extra importante.

 

V.A. – Optou por ter uma roulotte e não um estabelecimento. O que o levou a fazer essa escolha?

S.C. – Uma das razões é óbvia, numa roulotte, se a coisa não estiver a funcionar num sítio, mudamo-nos para outro. A roulotte está paga e nesse aspeto estou tranquilo. Claro que há outras despesas, e custos anuais de HACCPs, licenciamentos, inspeções… mas penso que é mais vantajoso.

 

V.A. – Quando chegou a Portugal em maio de 2013, formou logo a sua empresa? Houve entraves ou foi um processo fácil?

S.C. – Sim, assim que cheguei comecei logo a tratar de tudo. Nós comprámos a roulotte em França e montámo-la do zero, e lá, em França, já tinha sido tudo legalizado, pronto a trabalhar. Por isso fiquei espantado quando percebi que nada do que eu trazia de França era válido cá. Ou seja, a inspeção de gás que fiz na França, não é válida em Portugal, a inspeção sanitária a mesma coisa… Foram dois meses a andar às voltas, a insistir todos os dias, para tratar de tudo o mais rápido possível e conseguir tudo o que era necessário. Só este mês é que recebi, finalmente, o certificado de como sou feirante e vendedor ambulante. Ao fim de ano e meio, finalmente chegou. Felizmente a ausência desse documento não me impediu de trabalhar, porque tinha o comprovativo em como tinha sido pedido… mas realmente é preciso muita vontade para conseguir ter tudo em ordem.

 

V.A. – Existem mais pessoas envolvidas neste projeto, ou ele é desenvolvido apenas por si?

S.C. –  Este é um projeto principalmente meu, mas a Daniela, a minha namorada, trabalha comigo sempre que faz falta. Estávamos os dois em França e encontramos neste projeto uma hipótese de voltar para Portugal, porque para mim, não fazia sentido voltar, para vir trabalhar para um patrão, estava fora de questão. Por isso decidimos arriscar com esta ideia.

 

V.A. – Optou por ter uma “agenda” rotativa, não se fixando apenas a um local. Esse método não poderá dificultar a fidelização de clientes?

S.C. – Não acho que isso possa ser um problema, até porque eu estou sempre no mesmo sítio, naquele dia da semana. À segunda-feira estou sempre na Tôr, à quarta-feira em Benafim, à quinta-feira na Portela de Messines e à sexta em Santa Margarida, perto de Alte. Sempre junto a cafés ou bares locais, porque a ideia é também fazer trabalhar esses estabelecimentos. Eu não vendo bebidas durantes estes dias, e assim muitos dos clientes acabam por jantar no sítio e sempre consomem uma bebida ou outra.

Aos fins-de-semana é que é diferente. Vai variando, dependendo dos eventos que surjam, embora, agora no Inverno hajam poucos. Só à terça é que não temos local, porque é um dia dedicado a outras coisas que também são importantes, ir às compras, tratar de papelada, documentos, contabilidade, essas coisas.

 

V.A. – Em que tipo de eventos costuma participar?
S.C. –
Em Loulé, costumamos estar na Feira Popular, também já fizemos o Festival Med e a Noite Branca… No verão passado estivemos no Festival F, em Faro, que correu muito bem, é conforme vão surgindo.

 

V.A. – O que o levou a optar pelas pequenas localidades e não pela venda junto de áreas mais turísticas, por exemplo?
S.C. –
Muitas pessoas chamaram-me louco por querer trabalhar nestes meios pequenos. Muitas pessoas, clientes e amigos, dizem-me para ir para Albufeira, Portimão, para a beira-mar, onde há turismo. E realmente seria capaz de funcionar melhor… mas não me interessa! Não me apetece trabalhar com turistas, que vou ver só uma vez na vida, nem estar ao pé de discotecas durante a madrugada a aturar turistas embriagados. Interessa-me mais trabalhar com clientes que voltam porque gostam, que falam connosco e vão experimentando uma pizza hoje, outra amanhã... Além disso, sou alérgico às cidades. Nunca vivi em cidades, nem aqui nem na França. Eu quando vou a Loulé, porque preciso de tratar de alguma coisa, estou desejando fugir de lá. Não gosto.

 

V.A. – Tem muitos amigos em Portugal? Como é que eles encaram o facto de o Sérgio ser vendedor ambulante?

S.C. – Sim, tenho vários amigos cá, embora a maioria da minha geração esteja espalhada pelo mundo. Grande parte dessas amizades é resultado do meu regresso a Portugal quando tinha 19 anos. Estive cá 6 anos, numa experiencia de agricultura biológica, que não foi viável, e por isso voltei para a França, com os meus 26 anos, e ai já ia com o objetivo de aprender padaria francesa, porque é algo que me dá trabalho em qualquer parte do mundo. Hoje em dia tenho um diploma de padeiro e dez anos de experiência, o que me permite trabalhar onde quiser, uma vez que a padaria francesa é a mais procurada. Essa será a solução para o caso de algo correr mal.

Quanto à forma como eles veem esta minha atividade, posso dizer que no início não acreditavam muito, mas agora que veem que vai tendo algum nome, já vão acreditando mais e muitos deles são também clientes.

 

V.A. – Quais são as suas expetativas de futuro? Tem mais projetos em mente?

S.C. – A minha principal intenção é ficar em Portugal. A qualidade de vida que cá temos, não tem nada a ver com o que temos lá fora…depois vamos vendo. Quanto ao negócio, as minhas expetativas de futuro são chegar a um ponto em que talvez possa ter uma reserva monetária e poder, talvez, investir numa casa, quem sabe… Em tempos tive outro projeto que não se concretizou, era uma padaria… mas ainda pode ser... Não agora, que comecei com isto e é isto que temos de desenvolver agora, mas, eventualmente, um dia mais tarde, quem sabe.  

 

Por Verónica Chapuça