Um grupo de ex-estudantes da Escola Secundária Pinheiro e Rosa, em Faro, Gonçalo Jacob, Cátia Orvalho, Luísa Lino e Rafael Pina, que concluiu recentemente o ensino secundário, veio apresentar o seu projeto: o livro «Rostos de Guerra».
Tudo começou num projeto escolar Erasmus+, que os levou à Grécia em 2017, onde tiveram contacto com refugiados sírios. A viagem marcou-os de tal forma que decidiram começar a escrever. A pouco e pouco os textos foram crescendo e deram origem a uma edição escolar. Começaram assim a participar em diversos eventos, entre eles o Festival Literário Internacional de Querença, até que, ainda em 2017, venceram o Prémio de Comunicação "Pela Diversidade Cultural" na categoria Jovem, promovido pelo Alto Comissariado para as Migrações. Continuaram a escrever, e passado algum tempo decidiram publicar todos os textos que tinham escrito, mas desta vez através de uma editora. Culmina assim esta aventura no lançamento de um livro, que se realizou no passado dia 10 de fevereiro na Fnac do Fórum Algarve.
VA: Uma pergunta inevitável e óbvia é como surgiu a ideia de plasmar todas as vossas experiências da viagem realizada, em textos até chegar a concretizar um livro?
Alunos: Quando começamos a escrever o nosso único objetivo era exprimirmos o que estávamos a sentir. Ver à nossa frente uma realidade tão diferente da que tínhamos vivido até aí foi intenso e escrever foi maneira que encontrámos para processar tudo o que tínhamos visto e sentido. Assim, começámos a escrever contos e poemas, até que nos apercebemos que juntos, tínhamos algo a dizer, algo a partilhar, e decidimos juntar tudo num só livro, na nossa coletânea. Foi um processo natural, visto que quando começamos a escrever não tínhamos sequer pensado em fazer um livro, simplesmente aconteceu.
VA: Com que apoio contaram, quem os incentivou ou foi parte de um projeto escolar?
Alunos: Inicialmente, depois da nossa mobilidade à Grécia, contámos com o apoio da escola e dos professores envolvidos no projeto. Esse apoio foi fundamental para nos permitir realizar uma publicação escolar, mas o nosso principal apoio veio de uma professora que nos acompanhou durante o projeto, a professora Clara Abegão. Mesmo depois do projeto terminar e nós termos concluído o ensino secundário, ela continuou a incentivar-nos e a prestar um auxílio que foi essencial para a edição do livro.
VA: Como foi a escolha do título deste livro e porquê?
Alunos: Sempre ouvimos falar de refugiados, porém é um tema (como muitos outros) que é de certa forma desumanizado pelos média, visto que a temática é muitas vezes tratada como apenas um acontecimento, negligenciando o lado humano. Porém, após o que vimos e sentimos, após passarmos para o outro lado do ecrã, percebemos o quão importantes são os sentimentos e pensamentos de que cada pessoa envolvida. O título do nosso livro surgiu assim como um relembrar que efetivamente os refugiados são pessoas, querendo abordar a questão por um lado mais emocional, surgindo assim “Rosto de Guerra”. Queremos principalmente que “Rostos” transmitam aos leitores uma ligação de empatia com todos aqueles que sofrem a questão.
VA: Neste livro qual é para vocês a parte mais marcante ou que mais vos emociona?
Alunos: O que mais nos marcou no livro foi o processo de o construir. O exprimir a experiência, o contraste das realidades, a empatia que não pudemos evitar sentir ao escrever, a amizade que criámos entre nós, escritores. Não há, no livro, uma parte que mais nos emocione. É todo o livro.
VA: Até onde pretendem chegar com este livro?
Alunos: O objetivo com a criação deste livro, para além de ter sido uma maneira de processar o que vimos e sentimos com a nossa experiência, é acima de tudo transmitir a mensagem, uma mensagem de empatia com a situação que presenciámos. Queremos que esta temática não deixe de estar presente, porque efetivamente continua a ser um problema real, apesar de já não ser falado. Pretendemos continuar a divulgar o nosso livro para manter a nossa mensagem viva, para manter a empatia para com a situação viva também.
VA: Num futuro próximo quais são os vossos objetivos enquanto escritores? Já tem mais alguma ideia ou obra planeada?
Alunos: Nenhum de nós tinha escrito antes de começarmos a criar este livro, foi o descobrir de um mundo novo, até porque a ideia de escrever começou por ser algo que fizemos sem o intuito de publicar, não tínhamos essa possibilidade em mente sequer quando começámos. Ao longo do tempo decidimos que era uma temática demasiado importante para não partilhar o que tínhamos a dizer sobre o assunto, e foi por isso que decidimos publicar. Não temos, para já, objetivos futuros, queremos apenas continuar a partilhar a nossa mensagem com este livro.
VA: A quem está dirigida este tipo de leitura?
Alunos: A mensagem principal do nosso livro é a empatia, sendo o público-alvo toda a população. Queremos que tanto jovens, como adultos, como idosos, tenham presentes esta temática, visto que um dos nossos principais objetivos com o livro é a partilha, o partilhar para pensar, para debater, para mover.
VA: O que ficou desta experiência? Que marcas? Que conclusões? Que objetivos?
Alunos: Com esta experiência ficou uma vontade de partilhar, de não ficar calados. Após presenciarmos tudo o que vimos e ouvimos, através de entrevistas e visitas, a nossa visão sobre a nossa posição quanto pessoas no mundo, mudou, e muito. Marcou-nos perceber tudo aquilo que temos, as oportunidades que nos são dadas e o poder que temos para mudar, tanto nós próprios como o que nos rodeia. Temos uma voz, e uma voz que pode ser ouvida, querendo por isso, continuar a partilhar, é esse o nosso principal objetivo, deixar a temática presente e de certa forma mostrar que se pode sempre fazer algo.
VA: E já agora quais foram as maiores dificuldades em todo este processo?
Alunos: Para quem ainda nada tinha escrito, foi-nos difícil a concretização dos contos, o pôr em palavras aquilo que tínhamos para dizer, e de forma a que não desrespeitassemos quem realmente vive nesta situação, apesar daquilo que escrevemos ser a nossa visão das coisas. Foi também um desafio criar entre autores um ambiente de confiança para partilhar, porque começamos esta experiência como estranhos e só depois, à medida que fomos criando o livro, nos fomos tornando amigos. Após percebermos que queríamos realmente publicar o livro, sentimos algumas dificuldades em encontrar apoio para concretizar a publicação. Chegámos a ficar bastante desmotivados porque parecia que não havia possibilidade de publicar o livro, mas acabámos por encontrar uma editora e por ter o apoio da Câmara Municipal de Loulé.
VA: O que aconselham a outros estudantes que pretendam enveredar por este mesmo caminho?
Alunos: Aconselhamos a quem tem algo para dizer, seja o que for, que partilhe a sua ideia com o mundo. No entanto, é necessário persistir face às dificuldades porque o mundo editorial não é um caminho fácil a seguir mas é um caminho que vale a pena.
Por: Nathalie Dias