Mário Manuel Coelho Santos, 54 anos, natural de São Sebastião, é Engenheiro Eletrotécnico e proprietário da Turinox, em Loulé. É também o responsável pelo vinho «Quinta da Tôr», um vinho algarvio que pretende ser uma referência na sua região de origem, o Algarve.
A Voz do Algarve – Tendo estado sempre ligado à área de engenharia eletrotécnica, e não à agricultura, o que o levou a enveredar pela vitivinicultura?
Mário Santos – Na verdade, eu cresci um pouco ligado a esta área, porque os meus avós sempre fizeram vinho de forma tradicional, embora não o comercializassem. E em jovem ajudei muitas vezes os meus pais no campo. Mas, de facto, a minha atividade nunca teve nada a ver com a agricultura, nem com o vinho, e tudo isto aconteceu um pouco por acidente. Esta Quinta que conheço desde miúdo sempre foi uma referência na freguesia da Tôr, onde fui criado. Quando apareceu à venda acabei por me interessar e, quando soube, já tinha feito o negócio. A partir daí, percebi que tinha uma vinha de 10 hectares praticamente abandonada, e tive de começar a tratar dela para não se perder.
V.A. – Quando comprou a Quinta pensava já na produção de vinho?
M.S. – Não! A compra desta Quinta surgiu completamente por acaso…talvez até tenha sido por ter alguns recursos financeiros e me assustar um pouco com o estado dos bancos. Isso ajudou a decisão, preferi ter os meus recursos financeiros investidos em imobiliário do que tê-los nos bancos.
V.A. – O que o levou a tomar a decisão de avançar com a produção de vinho?
M.S. – Essencialmente, a dimensão da vinha. 10 hectares não são propriamente uma brincadeira. Foi complicado, mas uma vez que a vinha estava legalizada, ou seja, que o passo mais difícil estava ultrapassado, achei que valeria a pena avançar. Começámos a recuperar a vinha em 2011. Seguiu-se depois todo um processo de legalizações e certificações. Existe muita burocracia, o que por vezes complicou este processo, mas com alguns apoios, quer da Comissão Vinícola, quer dos enólogos, tem-se conseguido ir passo a passo, legalizando tudo o que é necessário para se poder produzir o vinho. Este ano foi a primeira vez que fizemos uma produção significativa.
V.A. – Conta com alguns apoios financeiros?
M.S. – Não. Tudo tem sido feito com fundos próprios. Mas esta foi uma opção pessoal, porque quero ter autonomia para, caso o projeto não vigue como eu espero, “fechar a loja”, como se costuma dizer, e não ficar com problemas.
V.A. – Como surgiu a marca e o design do rótulo?
M.S. – O nome “Quinta da Tôr” tinha de ser! Simplesmente porque fazia todo o sentido. E a presença da ponte no rótulo também, porque é um monumento classificado e sempre foi um símbolo da Tôr muito relevante. Além disso, a Quinta está contigua com a ponte.
V.A. – Num mercado tão competitivo, e com a eclosão de várias marcas de vinhos algarvios, o que vai distinguir o “Quinta da Tôr”? Crê que poderá estar ao mesmo nível dos novos produtores com algum renome a nível nacional e internacional?
M.S. – Em primeiro lugar o “Quinta da Tôr” vai ser um vinho tipicamente algarvio, que é sempre diferente do vinho do Alentejo ou do Norte. Aqui no Algarve o terreno e o clima são diferentes. E claro, o principal são as uvas e os bons aromas, e também a qualidade das castas, que no nosso caso são cinco: o Aragonês, a Trincadeira, a Touriga Nacional, o Syrah e o Cabernet Sauvignon.
Na minha perspetiva somos equivalentes aos nossos colegas do Algarve, cujos produtos são muito semelhantes ao nosso. Além disso, o nosso mercado é muito vasto e ainda há muito para conquistar. Na restauração, por exemplo, se experimentar pedir um vinho algarvio, como eu tenho feito, irá notar que a grande maioria dos restaurantes, no Algarve, continua a não ter vinho algarvio.
V.A. – A que se deve essa ausência no nosso próprio mercado?
M.S. – Deve-se provavelmente ao preço. Nós vamos concorrer com vinicultores do Alentejo que têm vinhas de 200 ou 300 hectares. Nós temos apenas 10 hectares. É uma grande diferença, que não nos permite os mesmos valores. Nesta situação o que temos de pensar é em fazer um pouco melhor e apostar no marketing, que é muito importante nesta área. Há muitos vinhos, muitas marcas e, por isso, é preciso fazer distinção entre os vários mercados e divulgar conforme o público-alvo, que nós pretendemos que seja, principalmente, a restauração algarvia. Aqui no Algarve temos o cliente habitual e o turista e devemos vender-lhes o que é nosso. Temos também alguns contactos para exportação, nomeadamente para Israel e para a Venezuela, mas inicialmente o nosso objetivo é vender no Algarve… Ainda não sabemos se vamos ter êxito desta forma… se tivermos, certamente não procuraremos os outros mercados. Mas claro, se isso não acontecer, teremos de vender o vinho no resto do país ou mesmo fora.
V.A. – Dadas estas dificuldades, não faria sentido que, no Algarve, os vinicultores se juntassem para criar uma marca de referência, de maior produção, que fosse facilmente identificada com o Algarve?
M.S. – No Algarve já existe uma classificação designada “Vinho Regional Algarve” que identifica os vinhos produzidos na região. É, aliás, esta a “marca” que tem sido promovida entre as várias entidades e produtores de vinho. Neste sentido, penso que a existência de vários produtores com pequenas produções até é uma mais-valia, uma vez que contribui para que haja diversidade.
Por ND