Esta será a taxa de esforço para uma em cada dez famílias já no próximo ano, segundo as previsões do Banco de Portugal.

A subida da Euribor para todos os prazos afeta particularmente os portugueses, já que cerca de 90% dos contratos de crédito habitação são de taxa variável. E o próprio Banco de Portugal (BdP) alerta que, com a subida das taxas de juro, a prestação da casa, em termos médios, poderá aumentar 92 euros até ao final de 2023. O que o regulador português também diz é que haverá uma em cada dez famílias que vão ter taxas de esforço superiores a 40% já no próximo ano.

“Os encargos com o serviço da dívida nos empréstimos bancários à habitação, maioritariamente contratados a taxa de juro variável, têm vindo a aumentar”, afirma o BdP no Relatório de Estabilidade Financeira de novembro de 2022, esta quarta-feira publicado. E as despesas com a casa vão continuar a aumentar, já que o regulador liderado por Mário Centeno afirma que é esperada uma evolução das taxas Euribor a 3, 6 e 12 meses até dezembro de 2023, que podem alcançar valores na ordem dos 3%. De notar que a Euribor a 12 meses diária já se aproxima dos 3%.É com base nesta evolução que o BdP estima que o valor total das prestações da casa pagas pelos particulares em empréstimos habitação passe de cerca de 390 milhões de euros, em junho de 2022, para 520 milhões de euros, em dezembro de 2023 (+75%). Este valor traduz-se numa prestação da casa média de 279 euros em junho de 2022 e de 371 euros no final do próximo ano. Ou seja, em média, as famílias terão de pagar mais 92 euros no crédito habitação.

Ainda assim, o BdP espera que para 41% dos contratos de empréstimos habitação, o aumento da prestação entre junho de 2022 e dezembro de 2023 seja inferior a 50 euros. Os aumentos na prestação da casa superiores a 150 euros são esperados para 18,1% dos contratos.

“Os encargos mais elevados com o serviço da dívida dos empréstimos à habitação contribuirão para a subida do rácio entre a prestação e o rendimento (LSTI, Loan service-to-income) médio em 4,8 pontos percentuais (p.p), até dezembro de 2023, para 21,5%”, conclui o regulador português. E tendo por base a evolução das remunerações do trabalho desde a data da última atualização de rendimento reportada até 2022 e 2023, o BdP estima que a taxa de esforço para pagar o crédito habitação vai ultrapassar as linhas vermelhas no próximo ano em vários lares. Isto porque em 11% dos contratos de crédito habitação a taxa de esforço deverá ser superior a 40%.

“Em junho de 2022, apenas 5,1% dos contratos de empréstimos à habitação tinham um LSTI atual superior a 40%, proporção que aumenta para 10,9% em dezembro de 2023”, explica o regulador, ressalvando que, contudo, mais de metade dos contratos continuará a ter a taxa de esforço atual igual ou inferior a 20%. Do ponto de vista de exposição dos bancos, a proporção do stock com LSTI superior a 40% aumenta 9 p.p., para 16,8%.

Risco de incumprimento está a aumentar em Portugal, alerta BdP

“A desaceleração económica e a subida da inflação, conjugadas com aumentos adicionais das taxas de juro de mercado, poderão deteriorar a situação financeira dos particulares, em especial entre os mais vulneráveis e num contexto de taxa de poupança reduzida, aumentando o seu risco de incumprimento”, analisa o BdP.

Esta é uma das consequências da pressão sobre os orçamentos familiares exercida quer pela subida dos juros nos créditos habitação (e no crédito ao consumo) e também da alta inflação que se faz sentir no país, taxa que atingiu os 10,1% em outubro. Mas nem todos os créditos habitação vão sofrer com as subidas de juros da mesma forma.

De acordo com o mesmo relatório, “os empréstimos à habitação celebrados entre 2019 e 2022 são os que apresentam um maior aumento da prestação média entre junho de 2022 e dezembro de 2023. Este facto observa-se por terem ainda uma percentagem elevada do montante contratado em dívida. São, também, estes contratos que apresentam uma variação mais elevada do LSTI atual médio, esperando -se um aumento de 6,5 p.p., para 23,7%.”, explica o regulador.

Ou seja, como em Portugal é utilizado o sistema de amortização francês, os créditos habitação mais recentes estão a pagar uma maior percentagem de juros no início do contrato, sendo mais o efeito da subida da Euribor. E como o peso dos juros vai descendo ao longo dos anos, os empréstimos da casa mais antigos não sentirão tanto o impacto da subida dos juros nas prestações.

Em resultado da atual conjutura, o BdP estima que o poder de compra é que ficará condicionado.  “Adicionalmente, a subida da inflação poderá levar a uma estagnação do rendimento disponível real dos particulares em 2022 e 2023, o que conjugado com maiores encargos com a dívida, pode condicionar o nível de consumo real”, explicam ainda.

O que pode mitigar o risco de incumprimento em Portugal?

Apesar da alta inflação, da incerteza e da subida dos juros, o BdP acredita que há vários fatores que tornam os sistema bancário mais resiliente e que mitigam o risco de incumprimento do crédito habitação em Portugal:

  • a redução do rácio de endividamento dos particulares, em particular para as famílias de menor rendimento, para um nível inferior ao da média da área do euro. E a concentração do crédito habitação em famílias de rendimentos mais elevados;
  • a melhoria do perfil de risco dos novos mutuários em consequência da Recomendação macroprudencial, a qual prevê, no cálculo da taxa de esforço de empréstimos com taxa variável ou mista e prazo superior a 10 anos, uma subida do indexante de 3 p.p.;
  • a redução da maturidade máxima dos contratos de crédito habitação para mutuários com idade superior a 30 anos, levando a uma restrição mais ativa do rendimento sobre a capacidade de endividamento;
  • a situação de escassez de mão-de-obra no mercado de trabalho, que tenderá a limitar o aumento do desemprego caso se observe um abrandamento mais acentuado da atividade económica;
  •  a acumulação de depósitos durante o período pandémico, em parte explicada pelas moratórias de crédito durante a pandemia;
  •  a adoção de medidas governamentais de apoio às famílias como o novo diploma que desenhou novas regras para renegociar o crédito habitação.

Por: Idealista