Elidérico Viegas, Presidente da Associação dos Hotéis e Empreendimentos Turísticos do Algarve, fala-nos sobre o impacto que a pandemia provocada pelo Covid-19 causou nos hotéis e empreendimentos turísticos do Algarve.

A Voz do Algarve: Como presidente da direção da Associação dos Hotéis e Empreendimentos Turísticos do Algarve (AHETA), qual é o impacto provocado pelo Covid-19 na região do algarve, a nível turístico e económico?

Elidérico Viegas: Como sabemos o setor turístico foi o mais afetado em todo o mundo. Na região, mais de noventa por cento dos hotéis encerraram, os restantes, embora tivessem permanecido em funcionamento, não tiveram clientes durante sensivelmente três meses e as empresas viram as suas receitas reduzidas a zero e numa forma totalmente inesperada. O impacto foi enorme quer nos hotéis e nas empresas, quer nas empresas hoteleiras e turísticas, quer na economia da região, visto que a mesma é muito dependente da atividade turística.

VA: Que apoios é que o governo tem dado para combater as repercussões que a pandemia irá causar no turismo?

EV: Muitas empresas entraram em lay-off, embora tivessem sido acionadas outras medidas. Continuamos, no caso de algumas empresas a aguardar ainda alguns apoios. Muitas delas já foram objeto de um segundo pacote de medidas, que é aquele que interessa analisar neste momento, ou seja, houve um alargamento do lay-off simplificado, no entanto as medidas não servem os interesses da região e por isso, até setembro é espectável que os elevados níveis de desemprego no Algarve, nos meses de março, abril e maio, irão subir exponencialmente uma vez que entramos em época baixa novamente.

Para além destas, outras medidas, nomeadamente para apoios financeiros e capitalização de empresas, tudo isso está ainda dependente das verbas que irão chegar da União Europeia. Portanto, estamos numa situação de empasse e expectativa relativamente aquilo que se vai passar. As empresas estão com uma dificuldade acrescida, pelo facto de terem deixado de ter receitas e ao mesmo tempo tem dificuldade em ter apoios financeiros que permitam suportar este período de dificuldades em que o negócio é inexistente.

Anteriormente, o turismo confrontava-se com uma falta de mão de obra generalizada e atualmente confrontamo-nos com o oposto, que é o excesso de mão de obra

VA: Tem ideia de quantos hotéis e empreendimentos turísticos no Algarve estão ainda encerrados? E quando irão reabrir ou não terão capacidade de o fazer?

EV: Nós sabemos que 85% dos hotéis e empreendimentos que encerraram manifestaram tenções de reabrir, alguns em junho e outros em julho, embora estejamos a assistir a alguns desses estabelecimentos, a um atrasar dessa reabertura. Tudo isto deve-se ao facto de falta de clientes, naturalmente e não havendo reservas, os hotéis e empreendimentos vão retardando a reabertura, embora a grande maioria tenha manifestado a intenção de reabrir já este verão.

VA: É conhecido o número de empresas que recorreram ao lay-off no Algarve?  Em que medida a retoma controlada do turismo poderá afetar e até levar ao encerramento de várias empresas?

EV: Numa maneira geral, todas as empresas aderiram ao lay-off simplificado, excetuando aquelas que por razões várias não o puderam fazer, quer seja porque não cumpriam os requisitos exigidos com dividas à segurança social e ao fisco ou por outros motivos, mas quase a totalidade aderiu ao lay-off.

Para além disso, os trabalhadores que estavam previstos contratar na época turística, no fim de março e início de abril, este ano como é obvio não se verificou, aumentando o número de desemprego da região.

VA: Agora que a situação está a voltar à normalidade controlada, quais são as medidas a tomar ou já tomadas por parte dos agentes turísticos e hotelaria?

EV: Estamos a retomar a atividade de uma maneira confiante e estamos conscientes que não vamos ter um ano turístico, nem igual nem parecido ao que tivemos o ano passado. Este ano o que perspetivamos é que as receitas possam abater os prejuízos que tivemos nos meses anteriores e isso é algo positivo dentro do negativismo que temos sentido, bem como a crise que se instalou, a chamada pandemia do coronavírus.

Os hotéis irão manter grande parte dos seus trabalhadores no lay-off, uma vez que não vão precisar de todos eles para a taxa de ocupações dos hotéis e não irão contratar novos trabalhadores como estava previsto inicialmente. Esta é a medida principal dos hotéis, evitar aumentar os seus custos e reduzir a mão de obra que é o maior custo das unidades hoteleiras e obviamente tiveram de fazer investimentos avultados, no sentido de criar condições de boas práticas para garantir a confiança aos turistas e as consequentes utilizações de empreendimentos turísticos, sem que isso constitua uma exigência desnecessária aos turistas e que isso não os desmotive a virem para o Algarve. Esses manuais de boas práticas associados a investimentos significativos que os hotéis tiveram de fazer em equipamentos e materiais que possam ser usados na gestão normal dos mesmos.

Estes vão desde máscaras a equipamentos mais sofisticados para desinfeção de quartos, zonas públicas, alojamentos, trabalhadores, clientes, entres outros. Tudo isto requereu investimentos significantes e que de uma maneira geral todos os hotéis da região aderiram a essa prática e adaptaram os seus planos de contingência a estas necessidades quer seja no distanciamento como na higienização, que atualmente, essas são as condições necessárias para que as pessoas possam frequentar lugares públicos.  Os clientes devem ser responsáveis cumprindo as regras quer seja de distanciamento como de higienização e proteção, mas cabe aos hotéis a maior responsabilidade para que tudo corra corretamente. Acreditamos que as práticas adotadas pelos hotéis serão suficientes para a não disseminação e propagação do vírus.

Penso que a partir da Páscoa do próximo ano iremos reiniciar o ano turístico com força, de um modo progressivo e que isso se reflita tanto no Algarve como na qualidade de vida dos algarvios

 

VA: Relativamente ao desemprego, quais são os números de desempregados e como é que essa situação está a ser controlada?

EV: É difícil dizer com exatidão porque é variável, muitas empresas optaram pela extinção dos postos de trabalho dos bares, restaurantes, etc. Isto porque perceberam que este ano não iriam ter clientes, então optaram por não reabrir. Sabemos que o número de trabalhadores contratados especificamente para a época turística rondará cerca de 4000 pessoas que não terão sido contratadas para esses efeitos, a esses juntar-se-ão aqueles que apesar de terem contratos fixos com os empreendimentos irão perder os seus postos de trabalho. No caso da hotelaria e do alojamento, essa situação só se vai fazer sentir mais em termos de números a partir do mês de setembro e outubro.

VA: Ao nível económico, já existe algum estudo ou informação fidedigna sobre o impacto do Covid-19 no turismo? Qual é o valor estimado, em milhões de euros das perdas dos hotéis e empreendimentos?

EV: Falando nos hotéis e empreendimentos turísticos classificados oficialmente, esses geram ou geravam em 2019 um total de 1 250 milhões de euros anuais.  Neste momento, é possível prever e na melhor das hipóteses, haverá uma faturação inferior em mais de 800 milhões de euros, ou seja 60% e 65% a menos, uma vez que que ainda temos alguma espectativa para aumentar as receitas com o aumento da procura, quer de mercado externo, quer de mercado interno neste mês e no mês de Agosto que são os meses por excelência do turismo no Algarve.

Segundo as Nações Unidas, atribuem Portugal uma perda de 12,4 mil milões de euros da atividade turística, se considerarmos que o Algarve é mais de 40% deste valor verificamos que o Algarve sofrerá uma grande perda este ano, a rondar aproximadamente os 5 mil milhões de euros que é uma verba astronómica para a região.

VA: Que expectativas é que tem para o futuro do turismo no Algarve? Acredita que o impacto das notícias sobre as festas em Lagos e a situação do corredor aéreo Portugal Reino Unido, possam afetar a vinda de turistas para Portugal?

EV: O turismo, tradicionalmente e em períodos de crise é o primeiro setor a ser afetado e a recuperar, no entanto, desta vez não se irá verificar. Foi sim o primeiro setor a ser afetado mas não o primeiro setor a recuperar, isto porque nós dependemos muito de fatores externos e não sabemos o que se vai passar ao nível do setor aéreo, isto porque as companhias de aviação estão a restruturar-se e a alterar o número de aviões e trabalhadores. Por outro lado, ao nível dos canais de distribuição de férias que estão muito afetados e que terão de recuperar para que a atividade regresse a uma normalidade.

Os negócios turísticos dependem deste circuito comercial, ou seja, transporte, ofertas de alojamento e canais de distribuição e comercialização, embora, no caso do Algarve saibamos que “independent treveller” vai ganhar uma importância crescente, será o turista que decide e marca as suas férias de forma independente, ou seja marca o avião e o alojamento por si só, sem recorrer a um agente de viagens que são fatores determinantes no turismo português. No caso do Algarve essas metas obtiveram respostas satisfatórias já que estamos bem posicionados no mercado online.

Relativamente a todas as notícias negativas sobre Portugal e em relação ao coronavírus, não são positivas, mas os nossos agentes de saúde agiram em conformidade e resolveram a questão em pouco tempo. Tudo isso é visto como uma mais valia para a região e isso dá garantias ao exterior que estamos preparados para enfrentar a pandemia e infeções caso elas venham a surgir. O Algarve como um todo teve praticamente fora da pandemia, embora esteja a sofrer consequências de uma elevada concentração de infetados em Lisboa e prejudica os interesses como é o caso do Algarve.  

VA: Por exemplo nos Açores, o governo regional com a campanha “Viver os Açores” está a oferecer um reembolso de até 175 euros a quem os visita, o que acha que deveria ser feito, para aliciar o turista nacional e estrangeiro a visitar o a Algarve?

EV: Nos nunca vivemos uma situação como a que vivemos agora e, portanto, cada um toma as medidas que considera mais adequadas, como é o caso específico dos Açores e da Madeira, entre outros destinos que por ventura tomaram outras medidas, no entanto aquilo que estamos a fazer é o adequado.

Por um lado, não estamos a ser desnecessariamente exigentes com a realização de testes e por outros estamos a tomar medidas que são suficientes, ou seja, estamos a fazer “alguma” coisa para evitar a propagação da doença e isso tem sido reconhecido por muitos dos estrangeiros que já começaram a chegar a região. Tudo isto, pensamos estar correto e adequado, no entanto, se verificarmos que estas medidas são insuficientes, iremos adotar novas medidas.

Os negócios turísticos dependem deste circuito comercial, ou seja, transporte, ofertas de alojamento e canais de distribuição e comercialização, embora, no caso do Algarve saibamos que “independent treveller” vai ganhar uma importância crescente, será o turista que decide e marca as suas férias de forma independente, ou seja marca o avião e o alojamento por si só, sem recorrer a um agente de viagens que são fatores determinantes no turismo português

 

VA: Que mensagem ou recomendação gostaria de deixar aos trabalhadores de hotelaria e empreendimentos turísticos no Algarve?

EV: Quero deixar uma mensagem de confiança para continuar a vida, não do mesmo modo como fazíamos antes, mas que deve continuar. A vida não pode parar, o turismo não pode parar, nada pode parar. Temos de ter confiança que aquilo que estamos a fazer é o mais indiciado para que possamos retomar progressivamente uma normalidade que é necessária e desejável para que possamos manter os nossos níveis qualitativos de vida.

A confiança é não só para os empresários como também para os trabalhadores que confrontados com uma situação desta natureza devem ter espectativas positivas para esta nova normalidade e em condições para contratar novamente trabalhadores. Anteriormente, o turismo confrontava-se com uma falta de mão de obra generalizada e atualmente confrontamo-nos com o oposto, que é o excesso de mão de obra.

Penso que a partir da páscoa do próximo ano iremos reiniciar o ano turístico com força, de um modo progressivo e que isso se reflita tanto no Algarve como na qualidade de vida dos algarvios.

VA: O que acha que pode ser feito para reverter a situação do “corredor aéreo” entre o Reino Unido e Portugal?

EV: O que nós achamos que deve ser feito é o seguinte: devemos ser capazes de atuar por duas frentes, por um lado, resolver a questão do número de infetados da região de Lisboa, que penalizou a região do Algarve e por outro lado, que o governo desencadeei as ações diplomáticas para ajudar a reverter a situação com o governo britânico, embora este ano já haja pouca solução, visto que quem viria para o Algarve no fim deste mês, já marcou as suas férias para outros locais.

 

Por: Carolina Figueiras