Após uma intervenção profunda, o Café Calcinha abriu portas na passada sexta-feira, 14 de julho, naquele que foi mais um momento marcante para a história de Loulé, com muitos louletanos a quererem conhecer a nova imagem deste emblemático espaço de tertúlia da cidade.

As obras visaram reabilitar o local cuja memória se funde com a vida e obra do poeta António Aleixo que aqui escreveu grande parte das suas quadras, mas mantendo a sua traça e mobiliário originais, nomeadamente as cadeiras e mesas de madeira e mármore, com o modelo do início do século XX, e os candeeiros Art Deco, entretanto recuperados.

A exploração do espaço, propriedade da Autarquia, foi concessionada, através de um concurso público, a um consórcio de três jovens empresários: João Apolónia, 35 anos, empresário, natural das Benfarras; Bruno Inácio, 34 anos, consultor comercial, natural de Querença e Tiago Soares, 33 anos, empresário, natural de Quarteira.

Para melhor conhecer este projeto, A Voz do Algarve foi conversar com estes 3 jovens e assim perceber o que os motivou para se lançarem neste desafio.

 

A Voz do Algarve - Já eram amigos ou foi uma ligação profissional?

Café Calcinha - Já nos conhecíamos, mas não tínhamos ligação profissional. Pontualmente, partilhávamos alguns grupos de amigos e dada a experiência profissional de cada um de nós, íamos seguindo o que cada um ia fazendo, da mesma forma, como o fazemos com tantas pessoas.

V.A. - Qual a vossa ligação ao ramo de atividade e como foi tomada a decisão de avançar com um estabelecimento que é o principal ícone na Cidade de Loulé?

C.C - Dois de nós, já trabalhamos à alguns anos no ramo da restauração e bebidas. O outro sócio não tem ligação a esta área. Afirmávamos sempre que nunca nos juntaríamos para abrir um café, mas o Calcinha é diferente. Cada um à sua maneira, todos temos uma ligação ao Café Calcinha. Ora, porque o frequentávamos regularmente, ora porque durante a Universidade, alguns de nós, ali passámos grandes momentos.

A decisão de avançar acabou por acontecer primeiro por provocação lançada entre nós, que rapidamente se multiplicaram em várias conversas que finalizaram numa decisão de avançar para o concurso público que a autarquia realizou. Move-nos acima de tudo a vontade e o desafio de manter a história do Café Calcinha como espaço icónico da Cidade.

V.A. - Qual o objetivo desta aposta? Qual o tipo de clientes, que esperam venha a frequentar este Café?

C.C - O que queremos é devolver à cidade o “Calcinha” com um espirito cultural muito forte. Queremos que isto não seja apenas um café mas seja um ponto de encontro onde as pessoas possam conversar, conviver e tertúliar. Adicionalmente que seja um polo de cultura gastronómica local e regional. Sem aspiração a ser um restaurante puro e duro, queremos a curto prazo, ter capacidade de serviços de refeições com uma especificidade: vamos ter curadores de ementa da estação. A cada mudança de estação vamos mudar de menu do dia e nessa mudança vamos pedir a figuras da gastronomia local para nos ajudar a escolher pratos locais, com um toque contemporâneo. Quanto ao tipo de público, queremos acima de tudo pessoas que gostem de Loulé ou que, não conhecendo a Cidade, queiram conhecer um espaço vivo da História local. Todos são bem-vindos ao Café Calcinha.

V.A. - Qual foi o vosso investimento? Como pensam obter retorno?

C.C. - Nós participámos num concurso público que tinha entre outros fatores o valor da renda do espaço como um dos elementos de decisão. O concurso é público e os valores também. Para além desse valor houve um investimento inicial de alguns milhares de euros. O nosso plano de negócios coincide com o tempo de contrato com a Autarquia, que é de 3 anos. Nesse tempo esperamos concretizar o nosso plano.

V.A. - Pensam evoluir para outros estabelecimentos deste ou outro género?

C.C. - O Café Calcinha é um projeto único e como tal não será um ponto de partida para outros similares. Queremos concentrar o nosso investimento e a nossa energia na implementação e no desenvolvimento de toda a operação comercial e cultural em torno do Café Calcinha.

Ao perguntar individualmente qual a relevância para cada sócio de reabrir o Café Calcinha, ficamos com a clara ideia que os três jovens se complementam neste projeto ambicioso.

Para Bruno Inácio; A história é feita destes momentos. Gostava que daqui a uns anos… muitos anos, quando deixarmos de gerir o Café Calcinha, que Loulé recorde este período, como um momento em que este espaço contribuiu de forma importante para a dinamização da Cidade. Observámos durante a inauguração que existe um grande valor sentimental das pessoas para com o Calcinha. Pessoalmente, é muito importante para mim, respeitar essa memória e trabalhar para que este período, seja um fio condutor para o futuro da cidade.”

João Apolónia referiu que; Nos últimos anos, tenho vindo a apostar no Centro Histórico de Loulé, nomeadamente com a «11 Gourmet», no Mercado Municipal e o «11 da Villa» no Largo Dom Pedro I. Acredito que as iniciativas empresariais diferenciadoras, acrescentam valor à cidade e o Café Calcinha é claramente um espaço que marca pela diferença e autenticidade no sentido positivo. Vamos trabalhar para tornar o Calcinha um espaço onde as pessoas se sintam bem.”

Tiago Soares afirmou que; O Café Calcinha é realmente um espaço único na Cidade de Loulé, na Região e até no País. Acho muito interessante esta ideia de apostar na requalificação de espaços antigos, para os dinamizar e colocar à disposição das pessoas, sejam elas residentes ou turistas. Acho que esta iniciativa vai ser importante para a Cidade. Vai criar mais um polo de atração e isso é muito positivo para todo o comércio da Cidade mas também para o orgulho que os Louletanos têm no seu café.”

Até ao mês de setembro, o Café Calcinha estará em fase de pré-abertura, período durante o qual a gerência pretende adequar o espaço ao seu funcionamento ideal, acrescentando gradualmente um conjunto de produtos e serviços que irão de encontro à preferência dos clientes.

Localizado no centro de Loulé e no eixo comercial mais importante, o Café Calcinha foi durante o último século, e até aos dias de hoje, um marco sociocultural da população local e de todos os visitantes, sendo o único espaço de tertúlia na história da cidade, que lhe configurou o privilégio de ser o estabelecimento mais emblemático e referenciado na história local, integrando a “Rota dos Cafés de Portugal com História”.

Ao longo das décadas e no decurso da sua já longa história (foi implantado em 27 de agosto de 1927), muitos foram os nomes importantes da vila que o frequentaram e mais as histórias que por lá se contaram, de geração em geração, entre as tertúlias, os cafés, o medronho, o capilé ou a ginjinha e as cigarrilhas ou onças de tabaco. Dele fizeram parte figuras de prestígio da vida pública louletana e nacional, destacando-se Frutuoso da Silva, Bernardo Lopes, Bexiga Peres, Pedro de Freitas, Reais Pinto, José Inês ou Joaquim Magalhães. Mas nenhum deles, porém, atingira a notoriedade de António Aleixo, que se destacou pelas suas réplicas mordazes e subtis em quadras soltas e sábias; no exterior foi colocada uma estátua em bronze, numa homenagem mais do que justa ao poeta popular.

É hoje um dos cartões-de-visita da cidade, sendo a sua fachada e o seu interior retratados em muitos folhetos turísticos e internet como ex-líbris de Loulé. Em 2012 foi classificado como Imóvel de Interesse Municipal e, em 2014, a Câmara Municipal de Loulé adquiriu este edifício, pelo valor de 180 mil euros, a obra Camarária realizada teve um custo de 120 mil euros. O Café Calcinha integra a “Rota dos Cafés de Portugal com História”.