Por: Miguel Peres Santos – Mestre em Gestão Cultural pela Universidade do Algarve – miguelsantostavira@gmail.com

Esta é a madrugada que eu esperava 
O dia inicial inteiro e limpo 
Onde emergimos da noite e do silêncio 
E livres habitamos a substância do tempo 


Sophia de Mello Breyner Andresen, 25 de Abril in 'O Nome das Coisas'

 

A 25 de Abril de 1974, como todos sabemos, foi desencadeado pelo Movimento das Forças Armadas (MFA), um golpe de estado que colocava fim ao regime autoritário e ditatorial do “Estado Novo”, seguindo-se um processo revolucionário único e marcante para história de Portugal. É desse período que vamos falar, e de como Tavira assistiu a estes momentos, talvez dos mais quentes da sua história recente.

Como se verificou por todo o país, também em Tavira se regozijou com o golpe militar e com as promessas dadas aos portugueses de uma vivência democrática, de liberdade e de igualdade. Entretanto todos se perguntavam quem seriam os rostos dos novos movimentos democráticos e que dinâmicas teriam os mesmos no futuro do concelho de Tavira.

 

A TRANSIÇÃO NO PODER POLÍTCO AUTÁRQUICO

Se o “”25 de Abril”, se apresentou como um movimento que pretendia de uma vez por todas acabar com todo o poder instalado pelo “Estado Novo” e pela sua vertente corporativa, também é verdade que num primeiro momento o mesmo evitou o vazio de poder a nível do poder local. Esta situação verificou-se em Tavira, onde o executivo municipal, presidido pelo Eng.º. Luís Filipe Távora se manteve em funções, onde aguardou pelo desenrolar dos acontecimentos. A 30 de Abril, este executivo por iniciativa do Presidente da Câmara Municipal de Tavira em funções, reuniu extraordinariamente para analisar a situação política após o golpe militar, deliberando por unanimidade os seguintes pontos:

“(…) a) Saudar, reconhecer e apoiar a autoridade da Junta de Salvação Nacional e continuar a pugnar pela defesa dos altos interesses, na conjugação de esforços para a continuação das grandes obras;

b) Saudar e desejar à população o maior respeito pela ordem, trabalho e deveres cívicos de todos os cidadãos, para que a acção da Junta de Salvação Nacional seja facilitada a alta missão que foi incumbida

c) Transmitir por telegrama a Sua Excelência o Presidente da Junta de Salvação Nacional, General António de Spínola, esta deliberação, as saudações do povo do concelho e desta Câmara Municipal (…)”

 (ARQUIVO MUNICIPAL DE TAVIRA, Livro de Actas da CMT (1974-1975), Sessão de 30/04/1974, Fls. 8-9)

Apesar desta tentativa de se colocar “ao lado” da nova situação política, as funções deste executivo municipal foram de mais ou menos dois meses, pois o Decreto 236/74, de 18 de Junho, imposto pelo I Governo Provisório, obrigava a que os Presidentes e Vice-Presidentes das Câmaras Municipais fossem exonerados e substituídos pelo Vereador mais velho. Na tarde do dia 18 de Junho, após a divulgação em Diário do Governo, e segundo informações que foram divulgadas à época pelo Jornal “O Tavira”, o Presidente da Câmara Municipal Eng.º Luís Filipe Távora e o Vice-Presidente Vasco Viera da Mota, despediram-se dos funcionários camarários numa cerimónia simples e restrita (Jornal “O Tavira”, Nº 33, 27/06/1974, P. 1). As novas funções de presidência foram atribuídas ao Vereador José Emídio Sotero, devido ao impedimento do Vereador mais velho, Abílio Costa da Encarnação, tendo sido substituído, por José António de Oliveira.

A primeira reunião do novo executivo teria lugar a 21 de Junho, onde o novo responsável pelo município esclareceu os muitos tavirenses presentes na sala, que as suas funções eram “meramente transitórias” (ARQUIVO MUNICIPAL DE TAVIRA, Livro de Actas da CMT (1974-1975), Sessão de 21 de Junho de 1974, Fls. 40) até à entrada em funções da nova Comissão Administrativa, esclarecendo que não vissem nele “o Presidente da Câmara mas sim o Tavirense que, enquanto investido no cargo, o desempenhará com o maior interesse e devoção pelo Concelho” (ARQUIVO MUNICIPAL DE TAVIRA, Livro de Actas da CMT (1974-1975), Sessão de 21 de Junho de 1974, Fls. 40).

A 10 de Outubro de 1974, a Comissão Administrativa tomava posse, terminando assim as funções deste executivo municipal ainda com ligações ao “Estado Novo”, mas que evitou o vazio de poder e uma transição pacifica para o regime democrático, respeitando assim os anseios da população tavirense.