Experiência na Jornada Mundial da Juventude | «Dias na Diocese» em Loulé

A Voz do Algarve - Qual a importância da visita dos jovens ao concelho de Loulé como parte integrante da Jornada Mundial da Juventude?

Pe. Carlos Aquino - Vivemos nos passados dias 25 a 30 de julho em Loulé uma experiência inolvidável, acolhendo cerca de um milhar de jovens provenientes de seis Países: Itália, Alemanha, França, Polónia, Kuweit, Eslovénia, que se fizeram peregrinos às Jornadas Mundiais da Juventude a realizarem-se na semana de 1 a 6 de agosto em Lisboa com a presença e presidência do amado Papa Francisco. Fomos uma Cidade, que soube desde a primeira hora, acolher e exprimir verdadeiramente a alegria da fraternidade. A fé que norteou o coração dos participantes e o serviço afetuoso e próximo tornou, certamente fecundo, este evento, na vida de todos os seus participantes, que o manifestaram nas suas partilhas e testemunho. Todos partiram com o coração cheio e felizes, marcados pela alegria imensa de um bom acolhimento e de extraordinária organização. Penso que estes valores humanos do acolhimento, de uma fraternidade autêntica, de partilha de cultura e saberes, de sacrifício em benefício do próximo, deixaram marcas indeléveis no coração e na vida dos jovens que nos visitaram, tendo alguns manifestado interesse em regressarem com família ou amigos. Também eles nos enriqueceram trazendo as suas vidas e culturas, a sua dimensão da fé vivida em alguns contextos como é o caso do Kuweit, com grande resiliência e generosidade.

VA - Para si enquanto Sacerdote, quais as mensagens mais importantes que o Papa deixou aos jovens nesta Jornada Mundial da Juventude?

Pe. CA - A primeira mensagem ficou logo expressa na sua preparação, na Mensagem para a JMJ em Lisboa, quando o Papa Francisco exprimiu com clareza, que seria um evento para que os jovens pudessem “experimentar novamente a alegria do encontro com Deus e com os irmãos e irmãs”. As JMJ são um acontecimento evangelizador para a partilha e o testemunho da alegria do Evangelho entre os Jovens. Destacaria a acentuação da vida como serviço e dedicação face à cultura dominante do egoísmo e da indiferença. A não ter medo dos sonhos e a não se hipotecar a Esperança que nos vem de Deus pela fé. A acender a verdade e a força do Evangelho no coração, sendo possuidores de vidas novas e sinais do amor de Deus neste mundo. A uma sábia e fecunda reconstrução espiritual da própria vida.

À edificação de uma igreja de portas abertas como é o coração de Deus, casa de Família para todos experimentarem a doce presença de Deus nas suas vidas facilitando o encontro com Ele.

A assumir verdadeiramente sem medo e vergonha uma identidade e missão cristã, que transforme o mundo e construa uma nova civilização. Seguindo as suas intervenções em Portugal, sublinharia nas palavras de saudação proferidas no Discurso com as Autoridades, com a Sociedade Civil e com o Corpo Diplomático: “Estou feliz por estar em Lisboa, cidade do encontro que abraça vários povos e culturas e que, nestes dias, se mostra ainda mais universal; torna-se, de certo modo, a capital do mundo, a capital do futuro, porque os jovens são o futuro (…) “O mundo tem necessidade da Europa, da Europa verdadeira: precisa do seu papel de construtora de pontes e de pacificadora no Leste europeu, no Mediterrâneo, na África e no Médio Oriente (…).

Das palavras proferidas com o Clero sublinharia: “Na barca da Igreja, deve haver lugar para todos: todos os batizados são chamados a subir para ela e lançar as redes, empenhando-se pessoalmente no anúncio do Evangelho. E não vos esqueçais desta palavra: todos, todos, todos (…) Que a Igreja não seja uma alfândega para selecionar quem entra e quem não entra”. Do Encontro com os Universitários destacaria: “Sede protagonistas duma nova coreografia que coloque no centro a pessoa humana, sede coreógrafos da dança da vida. (…) tende a coragem de substituir os medos pelos sonhos (…) Não esqueçais que temos necessidade duma ecologia integral, de escutar o sofrimento do planeta juntamente com o dos pobres”.

Na Vigília com os Jovens: “O único modo, a única situação em que é lícito olhar de cima para baixo uma pessoa é para ajudar a levantar-se! (…) É preciso caminhar e, no caso de cair, levantar-se; caminhar com uma meta; treinar-se todos os dias da vida. Na vida, nada é de graça. Só uma coisa é gratuita: o amor de Jesus!”. Da Homilia da Missa: “Tornamo-nos luminosos, resplandecemos quando, tendo acolhido Jesus, aprendemos a amar como Ele.  E por fim, no Encontro final com os Voluntários: “Experimentámos que um pequeno sim a Jesus pode mudar a vida; mas também o sim dito aos outros nos faz bem, quando tem em vista o serviço (…) O que é preciso é dilatar o coração. E se alargardes o coração, colocareis ordem na vossa vida (…) continuai a cavalgar as ondas do amor, as ondas da caridade, sede surfistas do amor!”.

VA - O que significa para um País receber a visita do Papa numa Jornada Mundial da Juventude?

Pe. CA - Significa um momento de graça, espiritual, mas também de fortalecimento da própria identidade do País, para além, certamente, de ser um acontecimento manifestamente político e de auspiciosa fecundidade humana, religiosa e social. O Papa é um chefe de Estado mas também o que preside na caridade como Bispo de Roma à comunhão e unidade entre todas as Igrejas.

VA - Como decorreu a iniciativa “Dias na Diocese” em Loulé?

Pe. CA - O sucesso deste Encontro em Loulé, que a tantos mobilizou, deveu-se inequivocamente à participação pronta, competentíssima e generosa de tantas famílias e voluntários das Paróquias, mas também a tantas Instituições que desde o primeiro momento acolheram e se disponibilizaram à participação: a Câmara Municipal de Loulé, as Juntas de Freguesia, a GNR, os Bombeiros, a Proteção Civil, o SNS e várias Instituições sociais e desportivas da cidade e do Concelho, os diversos Meios de comunicação social. Sem essa presença e contributo não teria sido possível a organização deste singular Encontro. Sinto que soubemos bem exprimir estes dias nas nossas vidas o apelo do Lema que inspirou esta peregrinação juvenil: todos soubemos levantar-nos para partir apressadamente ao encontro do outro! E quantos sinais maravilhosos se manifestaram nas vidas e as transformaram! Certamente também todos ficámos mais enriquecidos pelo dom que cada jovem, nestes dias, foi para nós.

VA - Quais foram as principais atividades oferecidas aos jovens e como foi a envolvência de outras entidades externas à igreja?

Pe. CA - Durante os dias de estadia na Cidade a oferta das atividades aos jovens foi diversificada sendo acompanhada pelas Instituições já referenciadas. Foi valorizada a dimensão cultural, social e religiosa. Para além dos tempos de oração em comunidade, participaram também em várias atividades de cariz social e de voluntariado, como foi o caso da visita aos lares e da visita aos doentes, e também em diversas e apelativas atividades desportivas e culturais. Tendo havido sempre agenda para a visita à Cidade, enriquecimento cultural e partilha da vida.

VA - Tendo a Jornada decorrido sobre o tema “Maria, a Mãe e a Mulher” como avalia a simbologia da Subida ao Santuário? Acredita que foi possível envolver os jovens neste espírito muito louletano ligado ao culto da Mãe Soberana?

Pe. CA - Foi muito significativo e de extraordinária importância a vigília e Peregrinação ao Santuário de Nossa Senhora da Piedade no dia 28 de julho à noite. Penso que foi o momento mais marcante na vida dos jovens, que nos visitaram, o se deixaram tocar e envolver pela alma e piedade louletana. Era preciso valorizar nos Dias da Diocese da JMJ, no Algarve, o Santuário da Mãe Soberana, primeiramente pela presença de Maria, fonte de inspiração para um discipulado que o Papa deseja seja assumido por todos os jovens e pela Igreja.

Como Ela sabermos partir apressadamente ao encontro do mundo e dos irmãos levando a bela e feliz Notícia, o Evangelho de Deus: Jesus Cristo. Depois, porque a Nossa Senhora da Piedade, havia sido consagrado estas Jornadas em Portugal por D. Américo Aguiar, quando aqui se fizera peregrino sendo o Pregador oficial das festas em honra de Nossa Senhora da Piedade. A Ela confiou por esta intenção, o seu próprio anel Episcopal. Foi, na verdade um momento singular, poético, marcado pela procissão de velas, o silêncio, a música e o canto, particularmente aquele que faz parte da nossa identidade portuguesa, o fado, a adoração Eucarística, manifestações de uma piedade genuína, humilde, simples, mas bela e autêntica da Igreja.

VA - Como foi montar toda esta logística, assim como, o sentimento vivido por todos e principalmente pelos voluntários que estiveram 24 sobre 24 horas com estes jovens?

Pe. CA - Constituiu um grande desafio a organização deste evento, mas direi que o sentimento vivido por todos foi o de uma imensa alegria o fato de terem colocado as suas vidas, muitas vezes com algum prejuízo do trabalho pessoal e da atenção à família ao serviço destes irmãos, assumindo isso não como um ato heroico, mas expressão de muito amor e fé. Sentiram que deram muito, mas também receberam muito e isso é motivo de grande felicidade. Não posso não referir entre os muitos voluntários da Comunidade aos quais bendigo o Senhor pelo dom que são e continuo a pedir-lhe que os abençoe, ilumine e conduza, dois dos grandes colaboradores das Paróquias de Loulé aos quais estou profundamente grato pelo que são e realizaram em nome da comunidade cristã com inexcedível competência e empenho: o Paulo Canário e o Pedro Rodrigues.

VA - Acredita que com esta experiência ocorrida em várias cidades de Portugal, assim como na própria Jornada, a Fé, assim como, a imagem da Igreja tenha saído reforçada?

Pe. CA - Não sei se saiu reforçada, atendendo a que neste momento, os escândalos que ensombram a Igreja e também sinuosas correntes ideológicas e preconceitos não facilitam a que seja acolhida a verdade da sua identidade e missão. Acresce a grande indiferença perante o espiritual e o religioso. Mas acredito que quem permanece fiel à Igreja e vive a fé com autenticidade será fermento em muitas vidas. Na Igreja onde todos são pecadores, existem também santos. A Igreja também é mistério, não simplesmente Instituição. É realidade divina e Deus a conduz e edifica. Precisamos da Igreja e da fé. Ficaremos mais pobres e frágeis se Ela não for Casa de Deus e para Deus.

VA - Acha que os objetivos assim como as expetativas foram alcançados?

Pe. CA - Perante o tanto que se disse e escutou, desvalorizando e descentrando em tantas ocasiões a importância deste acontecimento e o seu significado, depois de algumas expetativas mais negativas fruto de uma menorização do evento e da sua importância, penso sinceramente pelo número de participantes e pelos momentos que foram vividos neste singular evento, que os objetivos foram, na verdade, alcançados.

VA - Qual o seu balanço final, agora que este evento já finalizou?

Pe. CA - As realidades e os acontecimentos, que vivemos pela fé, só a partir da ação do Espírito e dos frutos que imprime em nossas vida e se manifestam no tempo e na história, podem ser avaliadas, mas direi num primeiro olhar sobre a realização deste acontecimento que o balanço é francamente positivo, particularmente pela presença,  alegria e motivação de tantos jovens do mundo inteiro que se fizeram peregrinos e disseram sim à Igreja e à missão e pelas palavras sábias, interpelativas e profundamente desafiadoras do Papa Francisco.

VA - Quer aproveitar para deixar uma mensagem final, àqueles que participaram neste evento, aos crentes, e á população em geral?

Pe. CA - Aos que participaram neste evento desejo que o encontro com Cristo em Igreja possa dar frutos nas suas vidas. Passem do desejo ao compromisso de serem alegres testemunhas de Evangelho e construtores de um mundo novo. Sejam já sinal do amor de Deus neste mundo e na Igreja.

Vivam, na verdade da fé, esperança e caridade e saibam levantar-se pronta e apressadamente como Maria para irem ao encontro do irmão, servindo-o com misericórdia e verdade. Aos crentes, que não esqueçam as palavras do Papa: “Na barca da Igreja, deve haver lugar para todos: todos os batizados são chamados a subir para ela e lançar as redes, empenhando-se pessoalmente no anúncio do Evangelho.

E não vos esqueçais desta palavra: todos, todos, todos (…) Que a Igreja não seja uma alfândega para selecionar quem entra e quem não entra”. É urgente nos empenharmos em edificar a Igreja a partir da fé em Jesus Cristo, vivendo por Ele, caminhando com Ele e construindo n’Ele, vencendo a hipocrisia de uma religião tradicional e costumeira, mas velha, sem alma, sem amor, fraternidade e sem sonhos. À população em geral, pediria que soubessem sempre distinguir o trigo do Joio e não tivessem preconceitos a respeito da Igreja, comunidade fraterna a revelar o valor e o sentido da vida de todos nós.

 

Por: Nathalie Dias